No início do capítulo 18 do evangelho de Mateus, Cristo estava em sua casa com seus discípulos, em Carfanaum. Este é o momento que se segue logo após a conversa sobre o pagamento do imposto do templo, que finaliza o capítulo 17.
No trecho que vai do versículo primeiro ao décimo quarto, o Senhor Jesus Cristo ensina coisas importantes sobre como Deus trata pessoas que ainda estão no início da fé, as quais são, também, chamadas de "neófitos" pelo Apóstolo Paulo, em sua primeira carta dirigida a Timóteo (1Tm 3:6).
Ao longo do texto, Cristo expõe quatro situações importantes: a primeira é que no Reino de Deus não há e não entra MALDADE; por isso, quem deseja fazer parte desse lugar precisa estar totalmente limpo (ou justificado) da presença do mal.
Lembrando que "maldade" (ou injustiça), segundo a realidade do Reino, é todo o conhecimento ou informação contrária aos preceitos da justiça de Deus, e que dentro do coração do homem tem a capacidade de fazê-lo transgredir tais preceitos.
Enquanto crianças, os corações das pessoas geralmente estão ainda limpos com relação à maldade que opera no mundo (ainda que na carne ela já esteja presente). Então, eis aqui também mais um motivo pelo qual o Senhor falou aos seus discípulos que, para poder entrar em Seu Reino, é necessária uma "conversão" que leve as pessoas a serem como crianças.
Portanto, o Mestre explica, usando uma criança como exemplo, que quem deseja fazer parte do Reino de Deus precisa rejeitar todo o conhecimento advindo da maldade ao seu redor e também dentro de si, até que seu coração esteja como o de uma criancinha, que ainda não recebeu as informações que pervertem a justiça de Deus provenientes do mundo.
Ele diz: "...a não ser que vocês se convertam e se tornem como crianças, jamais entrarão no Reino dos céus."
A rejeição do conhecimento do bem e do mal (maldade) faz parte do processo da renovação do entendimento ou da mente, sobre o qual também o apóstolo Paulo explica em sua carta aos cristãos de Roma (Leia Romanos 12:2).
No entanto, esse processo só acontece de fato em quem experimenta o novo nascimento pela fé em Cristo Jesus. Quem não está verdadeiramente justificado (ou quem não é nascido dentro do Reino de Deus) jamais consegue rejeitar a operação da maldade, pois não conhece nem entende os princípios da justiça de Deus revelada por Cristo, tampouco compreende o poder e a autoridade provenientes dessa justiça perfeita.
O segundo ponto do ensino de Cristo é que no Reino de Deus há uma hierarquia entre as pessoas. Ele mostra que lá existe "alguém maior" e "alguém menor", em se tratando de poderio ou autoridade. E quem possui maior autoridade no Reino são aqueles que, enquanto estiveram na terra, foram pessoas HUMILDES.
Porém esta humildade sobre a qual o Senhor está falando não se trata de um status econômico, ou seja, não se refere à pobreza financeira, mas significa que o indivíduo esteve sempre disponível para servir os outros e para aprender e, especialmente, entendeu e se manteve submisso à autoridade de Deus.
Durante a infância, as pessoas normalmente estão mais abertas para serem corrigidas e para aprender e normalmente são submissas aos seus superiores (pais ou responsáveis). Foi por este motivo que Cristo disse que "o maior no Reino dos céus é quem se faz humilde como uma criança".
O Senhor Jesus aponta também uma terceira questão: receber uma criança que vem em nome dele é o mesmo que recebê-lo. Com isso, Ele está expondo duas situações especiais relacionadas ao início da fé cristã: a primeira é com relação às crianças que já creem em Jesus, e a segunda se relaciona a pessoas que somente depois da infância vieram a ter um encontro com Cristo, e ainda não entendem bem o Reino de Deus.
Os indivíduos que se encontram nesses estágios são vulneráveis à ação de pessoas mal intencionadas, pois ainda não têm maturidade no entendimento da justiça de Deus, podendo ser facilmente levados a receber doutrinas falsas, como se fossem vindas de Cristo. Infelizmente, sabemos que no meio do povo de Deus existem muitas pessoas que fingem estar na fé cristã, mas cujo propósito não é atrair as pessoas para Cristo e sim para si mesmas.
O Senhor Jesus avisa que todos os que fizerem tropeçar qualquer um desses, que ainda estão iniciando na fé receberão um juízo bem pesado, pois diz "melhor seria que amarrasse uma pedra de moinho ao pescoço e se afogasse nas profundezas do mar". O Mestre deixa claro que quem fizer mal a alguém que vem em Seu Nome, especialmente se forem neófitos, está ofendendo diretamente a Ele e é digno de um severo juízo.
Em outras traduções da Bíblia também pode ser achada a expressão "causar escândalo" ou a palavra "escandalizar" em vez de "fazer tropeçar". Ambas as proposições estão se referindo à mesma situação, que é afastar as pessoas de Deus, impedindo-as de conhecer e entender o Seu Reino, com ensinamentos que contrariam os princípios de sua reta justiça. Pessoas que agem dessa forma tanto estão tropeçando como também fazem os outros tropeçar, por não entenderem o Reino de Deus e a sua justiça.
Cristo diz, no entanto, que falsos mestres podem chegar a se arrepender de suas práticas, se alcançarem o entendimento do Reino de Deus de fato. Ele diz que, quando isso acontece, tais indivíduos precisarão abdicar daquilo que lhes alimenta o ego ou das coisas que satisfazem suas vaidades. Assim, o Senhor compara todas as motivações que levam os falsos mestres a agir com os membros de seus próprios corpos, como as mãos, os pés ou os olhos:
"Se a sua mão ou o seu pé o fizerem tropeçar, corte-os e jogue-os fora. É melhor entrar na vida mutilado ou aleijado do que, tendo as duas mãos ou os dois pés, ser lançado no fogo eterno. E se o seu olho o fizer tropeçar, arranque-o e jogue-o fora. É melhor entrar na vida com um só olho do que, tendo os dois olhos, ser lançado no fogo do inferno." (Mateus 18:8-9)
Não é que, literalmente, um indivíduo que se arrependeu de atrair as pessoas para si tenha que tirar fora a mão ou o pé ou o olho; porém, o fato desse alguém confessar o seu pecado e abdicar da fama, do sucesso, do dinheiro e do poder que conseguiu enganando as pessoas – e aos quais já estava muito acostumado –, pode lhe fazer sofrer tanto quanto se tivesse arrancando um dos membros do seu corpo.
No versículo 10, Cristo toca em um quarto ponto que finaliza seu raciocínio: que estes pequeninos aos quais Ele se refere NÃO DEVEM SER DESPREZADOS. Como já vimos, os pequeninos são todos os indivíduos que ainda estão no início de sua fé e que não têm entendimento do Reino de Deus e da Sua justiça. Por causa disso, tais pessoas tanto podem ser facilmente enganadas como também podem se decepcionar facilmente com quaisquer situações, deixando de congregar.
Muitas vezes acontece desses indivíduos se afastarem e serem esquecidos ou desdenhados por aqueles que lideram as congregações. Os que se afastam, geralmente, são pessoas que adoecem ou estão se sentindo diminuídas por causa de algum pecado que não conseguem deixar de praticar; elas também podem estar tristes ou cansadas por causa de alguma tribulação que estejam passando, ou até magoadas ou indignadas, ou mesmo assustadas com alguma coisa que viram ou ouviram no meio eclesiástico, e então resolvem deixar de ir à igreja.
Ao deixarem de congregar, por estarem ainda sem o entendimento pleno do Reino de Deus e enfraquecidas na fé, tais pessoas voltam às suas antigas práticas mundanas ou se enveredam em novas situações que podem prendê-las nas trevas ainda mais do que antes.
Então, o Senhor Jesus explica, através da parábola das cem ovelhas, que aqueles que estão responsáveis de cuidar desses indivíduos devem procurá-los e fazer o possível para reaproximá-los do convívio com seus irmãos, para que continuem aprendendo a Justiça de Deus e crescendo na fé verdadeira.
Quem faz o trabalho pastoral deve ter em mente que as pessoas que ainda estão iniciando na fé precisam de um cuidado maior do que aquelas que já entendem bem o Reino. Deus as ama muito e não quer que nenhuma delas deixe de usufruir da perfeita realidade que Ele oferece a todos gratuitamente.
É claro que o nosso Criador conhece a situação de todas as lideranças. Certamente, Ele sabe quando alguém tem condições de resgatar um pequenino, mas não vai, e quando a situação não permitiria fazê-lo, ainda que, caso o fizesse, faria de bom grado.
Deus sabe todas as coisas e é justo para com todos. Ainda que os pastores de uma congregação não cheguem até às ovelhas feridas, em momentos de dificuldade, seja qual motivo for, o próprio Jesus irá ao encontro delas para socorrê-las e resgatá-las. No entanto, quem se omite de fazer sua parte tendo plenas condições de fazê-la, e não se arrepende disso a fim de corrigir seu erro, sofrerá as consequências de seus atos depois.
Todos os que creem em Jesus são importantes para Ele, sem diferença.
Texto: Missionária Oriana Costa
Revisão: Pr. Wendell Costa